segunda-feira, 30 de agosto de 2010


TRÁFICO DE PESSOAS

 

Cláudio da Silva Leiria,
Promotor de Justiça em Guaporé/RS.
 


Pode-se definir o tráfico de pessoas como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso de força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra, para fins de exploração.
A exploração, no mínimo inclui a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, os trabalhos ou serviços forçados, escravatura  ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) calcula em mais de 12 milhões o número de pessoas em situação de trabalho forçado no mundo.  Desse total, 9,8 milhões são explorados por particulares (exploração com finalidade econômica e exploração sexual), dos quais 2,4 milhões foram vítimas de tráfico de seres humanos.  Outros 2,5 milhões são forçados a trabalhar por Estados ou por grupos militares rebeldes.
O tráfico de seres humanos movimenta cerca de 32 bilhões de dólares por ano, sendo considerada a terceira ‘indústria’ mais lucrativa do mundo. Um levantamento realizado pelo Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crimes mostrou que, para cada ser humano transportado de um país para outro, o lucro das organizações criminosas pode chegar a 30 mil dólares americanos por ano.
Há poucos dados disponíveis para se fazer um diagnóstico do problema no nosso país.  Um dos estudos mais importantes foi a ‘Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual’ (Pestraf), realizada em 2002, pela qual foram mapeadas 241 rotas de tráfico interno e internacional de crianças, mulheres e adolescentes brasileiros.
No Brasil, as vítimas do tráfico de pessoas geralmente são pessoas vindas das classes populares, com baixa escolaridade, e que habitam espaços urbanos periféricos com carência de saneamento e transporte.  Os principais fatores que as levam a se submeter à exploração são: desejo de renda maior ou status, fuga da opressão e da estigmatização e busca por estabilidade emocional.
Dentre as graves consequências para as vítimas do tráfico de pessoas podem-se citar as seguintes: danos psicológicos (depressão e síndrome pós-traumática; doenças variadas (decorrentes de doenças sexualmente transmissíveis, alimentação inadequada, condições insalubres da atividade, etc), perda de guarda de filhos, encarceramento, isolamento social, perda de bens pessoais (endividamento com traficantes), etc.; além do mais, há danos econômicos para o país, em razão da mão-de-obra desqualificada que se tornou a vítima, acarretando maior ônus para os programas sociais.
O tráfico de pessoas é de difícil combate, pois os riscos da atividade são baixos e os lucros são altos.  Os traficantes de pessoas normalmente escolhem como alvo indivíduos em grandes dificuldades financeiras.  Pessoas são abordadas com promessas de bons empregos, excelentes remunerações e pagamento de despesas variadas. 
O traficante de pessoas, por meio de intimidações veladas, ameaças e violência física mantém a sua vítima sob controle.  Ademais, as próprias vítimas pouco ou nada colaboram com a polícia e a justiça, em razão de vários motivos:  a) vítimas traumatizadas com frequência negam que tenham sido traficadas, mesmo quando confrontadas com evidências que contradigam seu depoimento; b) como mecanismo psicológico de defesa, as vítimas podem ter dificuldades em lembrar-se do que realmente aconteceu; c) cria-se clima de hostilidade da vítima para com as pessoas que lhes atendem; d) medo de represálias da pessoa que lhe explorava; e) algumas vezes ocorre a ‘revitimização’ da vítima, que é tratada como criminosa e não como vítima do tráfico de pessoas; em vez de serem submetidas à exames médicos para avaliação ou comprovação da violência, são encarceradas ou deportadas imediatamente, sem respeito aos seus direitos ou a um atendimento humanitário.
O caminho para combater o tráfico de pessoas passa pela criação de uma rede de proteção social eficaz, a fim de erradicar-se a miséria e outros fatores que levam as pessoas a se submeterem a vergonhosas formas de exploração; por uma ampla cooperação entre as polícias internacionais, já que grande parcela do tráfico de pessoas se dá entre os países; pelo aperfeiçoamento da persecução penal, com criação de instrumentos jurídicos mais ágeis, uma conscientização maior e melhor qualificação dos operadores do direito para lidar com essa espécie de delito; pela ampla conscientização da sociedade, que deve denunciar às autoridades os casos de tráfico de pessoas que tiver conhecimento. 

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